O papel do arquiteto em um novo mundo

Jean Tosetto (quem?) no dia da gravação do vídeo sobre o papel do arquiteto em um novo mundo. Clique na imagem para acessar o canal no YouTube.
Jean Tosetto (quem?) no dia da gravação do vídeo sobre o papel do arquiteto em um novo mundo. Clique na imagem para acessar o canal no YouTube.

O ano de 2020 está sendo desafiador para a humanidade. Os arquitetos, urbanistas e engenheiros não podem ficar de fora desta grande oportunidade de reordenamento das prioridades, incluindo as moradias e grandes cidades. Está é a transcrição adaptada de um vídeo gravado no dia 05 de abril.

Por Jean Tosetto


Olá meus amigos, proponho uma breve reflexão sobre como será o mundo depois que a Pandemia do Coronavírus passar – e você não será mais orientado a ficar dentro de casa. Mas, enquanto você está dentro de casa, vamos prestar atenção no lugar onde moramos.

A gente vê na televisão e na Internet entrevistarem médicos e economistas. Porém, muitos esquecem de conversar com os arquitetos, urbanistas e engenheiros civis, que são aqueles profissionais que estão diretamente relacionados com os projetos das casas e das cidades.

A sua casa é bem ventilada? Ela tem ventilação natural? Sua casa tem iluminação natural? O seu arquiteto ou o seu engenheiro se preocupou com isso no projeto? Ou você fez na sua casa sem projeto?

Muitas pessoas constroem sem projeto. É uma pena, mas acontece. A gente respeita essa decisão porque é uma questão de necessidade na maioria dos casos. Então nós, arquitetos e engenheiros: como podemos resolver os problemas das pessoas que não têm condições de pagar por um bom profissional?

Como podemos melhorar nossas casas? Será que a gente tem os arquitetos empenhados nisso, como temos psicólogos dispostos a conversar de graça com as pessoas, neste momento?

Casa organizada suaviza a rotina


Como você pode melhorar a sua casa? Minha recomendação é que olhe para tudo aquilo que você tem e que está ocupando espaço desnecessariamente. Papéis, contas que você pagou há mais de cinco anos: dê embora ou mande reciclar.

De repente a sua criança cresceu e você tem muitos brinquedos guardados, sendo que há crianças precisando de uma distração neste momento. Está na hora de você limpar os brinquedos e doar para outras famílias, para deixar outras crianças felizes.

Você deve ter coisas que você não usa mais, como roupas velhas, por exemplo. Está na hora de deixar outra pessoa vestindo seu casaco. Então, você perceberá que a sua casa vai ficar mais leve e a sua rotina vai ficar mais suave. Sua cabeça também vai ficar mais leve.

Em casa, nós estamos redescobrindo o prazer ou a necessidade de cozinhar o próprio almoço. Então, você tem que organizar a sua cozinha, para que sua esposa – ou você mesmo – prepare as refeições, que terão um sabor diferente, tenha certeza disso.

Quem sabe você tem um violão guardado atrás do armário, por causa da Internet e suas facilidades, esqueceu de tocar – de repente uma corda arrebentou, mas você poderá voltar a produzir novos acordes.

Quem sabe teremos uma leva de novos artistas, não mais para falar de balada ou de curtição, mas para propor músicas que nos façam refletir, como antigamente os compositores faziam.

Nossa cidade também é da nossa conta


Resolvemos o problema da nossa casa? São vários e não vamos resolver em cinco minutos. Mas vamos tratar agora das nossas cidades. Onde estão os urbanistas para bradar aos quatro ventos que precisamos de cidades melhores?

Veja o caso São Paulo. Tem gente que mora na periferia e precisa trabalhar no centro, pois exerce uma atividade essencial. São pessoas que entram em coletivos lotados e ficam duas horas no trânsito para poder trabalhar.

Será que a cidade poderia agir para melhorar isso? Claro que sim! Será que não podemos ter uma cidade onde moradias e trabalhos possam estar mesclados no tecido urbano, ou seja, se entrelaçando melhor? Podemos!

Para tanto, temos de consultar os urbanistas. Nessas horas onde eles estão? Estão nas faculdades? Estão nos sindicatos ou conselhos profissionais? Queremos respostas. Estamos falhando nisso porque sou arquiteto e urbanista. Sei disso. Nós estamos omissos nessa questão.

O Brasil é um país que não investe em saneamento básico. Então, os engenheiros civis precisam pressionar a sociedade e os políticos, para voltarmos a investir em saneamento básico. Se bem que a gente nunca investiu nisso para valer.

Ironicamente, nesta pandemia as pessoas são orientadas para lavarem as mãos e muita gente não tem água na torneira. Isso é um absurdo! O Brasil não fez a lição de casa. Entrementes, neste novo mundo que está para nascer, vamos respeitar, sim, os médicos e os economistas, mas vamos também ouvir mais os engenheiros, arquitetos e urbanistas.

O amanhecer de um novo tempo


O mundo será melhor. Vejo questões que estão sendo levantadas neste momento. O mundo estava ficando sem fronteiras: isso era o sonho de muita gente. Porém, um mundo sem fronteiras é um mundo onde as pandemias ocorrem mais facilmente. Então, como estão levantando barreiras sanitárias, acredito que elas ficarão por mais tempo.

O mundo voltará a ter mais fronteiras para restringir a o livre trânsito de pessoas e mercadorias. Não estou afirmando que isso é uma vontade minha: é apenas uma constatação.

Percebo também que finalmente valorizaremos o trabalho dos cientistas, que neste momento estão pesquisando remédios e vacinas para cura do Coronavírus. Temos, ainda, técnicos desenvolvendo equipamentos mais baratos e práticos para construir ventiladores mecânicos.

Portanto, a ciência tem a sua importância. Ela é muito mais importante do que o esporte e do que a indústria do entretenimento, pura simplesmente, que geram falsos heróis na sociedade: são pessoas que podem ser excelentes, mas que não possuem as respostas para necessidades vitais que nós temos.

Nada contra o atleta do futebol, que ganha milhões, mas nesse momento ele não tem respostas para nossos problemas. Por isso, temos que dar mais valor para cientistas anônimos, que muitas vezes passam anos da faculdade e não recebem o devido reconhecimento.

Ciência e crença


Nós também voltaremos a valorizar o lado espiritual. Cada um tem a sua religião, mas muitos esqueceram do lado transcendental. Sei que há muitas pessoas, agora, perguntando onde estará Deus. Não tenho a resposta, pois não sou teólogo. Porém, acho importante que você faça essa pergunta e acho importante que você procure por uma resposta.

No entanto, se você procurar ela onde todo mundo está procurando – nos mesmos sites, nas mesmas entrevistas, nas mesmas notícias repetitivas – de repente você não encontrará essa resposta.  Logo, você precisa de um tempo para você mesmo, dentro da sua casa, para reativar o seu lado espiritual e, ao mesmo tempo, respeitar o trabalho dos cientistas.

Essa ambiguidade é interessante. É por isso que acredito que teremos um mundo melhor em breve. É complicado falar isso no olho do furacão. Entretanto, esse é o papel de um arquiteto que pensa o futuro.

Espero que você faça sua própria reflexão e que possamos, juntos, seguir nessa jornada que está só começando.

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